TERCEIRO DOMINGO DA PÁSCOA, C.

“Aclamai a Deus, toda a terra, cantai a glória de seu nome, rendei-lhe glória e louvor, aleluia!”. (cf. Sl 65,1s).

 

Estamos vivendo este momento maravilhoso do tempo da Páscoa. São cinqüenta dias em que damos glórias e louvores pelo Senhor Jesus que venceu a morte, saindo da mansão dos mortos, e ressuscitando para assentar-se à direita de Deus Pai para proporcionar aos homens pecadores a vida da graça, a vida da plenitude eterna.

A Primeira Leitura (cf. At 5,27b-32.40b-41) nos apresenta o Testemunho diante do sumo sacerdote, colocada como a segunda defesa de Pedro diante do Sinédrio. “Importa mais obedecer a Deus do que aos homens”. Trata-se de um resumo do querigma cristão: anúncio do ressuscitado como salvador, pela remissão do pecado, o que supõe a conversão. De fato, na história da Igreja, Pedro aparece como líder e porta-voz. É ele que, diante do Sinédrio, em nome dos outros apóstolos, dirige ao sumo sacerdote a atrevida palavra, que parece ter sido um “slogan” dos primeiros cristãos: “É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens” (cf. At. 5,29) e pronuncia mais um testemunho da ressurreição de Cristo, que os chefes judaicos mataram.

O testemunho de São Pedro e dos outros apóstolos acerca de Jesus é a mensagem da primeira leitura. Presos e miraculosamente libertados (cf. At 5,17-19), os apóstolos voltaram ao Templo para dar testemunho de Cristo ressuscitado (cf. At 5,20-25). De novo presos, conduzidos à presença da suprema autoridade religiosa da nação (o Sinédrio) e formalmente proibidos de dar testemunho de Jesus, os apóstolos responderam apresentando um resumo do kerigma primitivo.

A proposta de Jesus é uma proposta libertadora, que não se compadece nem pactua com esquemas egoístas, injustos, opressores. É uma mensagem transformadora que põe em causa tudo o que gera injustiça, morte, opressão; por isso, é uma proposta que é rejeitada e combatida por aqueles que dominam o mundo e que oprimem os débeis e os pobres. Isto explica bem porque é que o testemunho sobre Jesus (se é coerente e verdadeiro) não é um caminho fácil de glória, de aplausos, de honras, de popularidade, mas um caminho de cruz. Não temos, portanto, que nos admirar se a mensagem que propomos e o testemunho que damos não encontram eco entre os que dominam o mundo; temos é de nos questionar e de nos inquietar se não somos importunados por aqueles que oprimem e que escravizam os irmãos: isso quererá dizer que o nosso testemunho não é coerente com a proposta de Jesus.

Meus caros irmãos,

A liturgia de hoje tem duas vertentes que devem ser consideradas: o Cordeiro Glorioso e Pedro, pastor e porta-voz do rebanho. A origem destes temas parece diferente, mas sendo a liturgia uma interpretação eclesial dos temas bíblicos, vale a pena interpretar um tema pelo outro. Aparece, por conseguinte, que o Cordeiro do Apocalipse, ou seja, da segunda leitura, deve ser visto como o Cordeiro que guia o Rebanho. Não é um cordeirinho, mas um carneiro. Solidário com o rebanho, o conduz à vitória. A este Cordeiro vencedor são dados os atributos de Deus: honra, glória, poder e louvor.

Mas todos os fiéis poderiam me perguntar: Por que Jesus é chamado o Cordeiro? A literatura do Apocalipse gosta de indicar pessoas e potências por figuras de animais. Além disso, Jesus foi logo considerado vítima expiatória e vítima pascal, como mostram o evangelho e a primeira carta de João, oriundos do mesmo ambiente que o Apocalipse. Como vítima expiatória, Jesus vence os poderes do pecado, representados, no Apocalipse, por feras. Portanto, o Cordeiro é um vencedor, não pelas armas, mas pela solidariedade com o rebanho, assumindo a morte por suas ovelhas.

Meus queridos Irmãos,

Todos nós somos convidados a acreditar e dar testemunho na ressurreição de Jesus. Não uma opção que seja meramente com provas históricas. Mais do que isso a ressurreição só pode ser entendida se vivenciada com absoluta convicção de que Jesus, o vencedor da morte, ressuscitou verdadeiramente. Aleluia!

A ressurreição marca um novo começo da presença histórica de Jesus no mundo. Mas em condições diferentes do tempo de sua vida pública. Os Evangelhos e as Cartas chamam Jesus de “Senhor”. Diante dele, fala Paulo que: “dobre-se todo joelho de quantos há no céu, na terra e no inferno, e toda língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor!” (cf Fl 2,10-11).

A partir da ressurreição os discípulos passam a se considerarem “servos do Senhor Jesus”. Assim foi Tiago, foi Pedro, foi Paulo e continua sendo os sucessores de Pedro na Sua Cátedra. Assim tem sido o novo Papa Francisco, como foi o peregrino Bento XVI, que lutando contra toda a esperança humana continua servo do Senhor Ressuscitado.

Mas, realmente, o Evangelho de hoje é esplendoroso em significados. Ali estava à beira do Mar Tiberíades um pequeno grupo de discípulos de Jesus. Todos estavam desanimados e se colocaram a pescar. Não estavam preocupados com o anúncio da ressurreição de Jesus e com as coisas de Jesus. Para eles o importante era pescar e pensar em si mesmos. Uma atitude bem humana. De Pedro foi à iniciativa para a Pesca: Vou pescar. Mas, infelizmente, nada pegaram com suas redes.

A pesca de que fala o Evangelho é muito superior: vamos pescar homens e mulheres para o Reino de Deus. Pescar é o iniciar a missão e a atividade apostólica que foi legada por Jesus a seus discípulos.

O fracasso da pesca de Pedro e dos companheiros, embora excelentes conhecedores do mar e dos peixes, não é apenas a conclusão de uma pesca sem êxito, mas a tradução concreta do que Jesus dissera na Última Ceia: “Sem mim nada podeis” (cf Jo. 15,5).

Ressurreição, tempo novo de Deus para a humanidade e, particularmente, para a comunidade que acreditou que Jesus verdadeiramente ressuscitou para lavar nossos pecados. Com Cristo, por Cristo e em Cristo Jesus nos ensina o caminho a ser trilhado para dilatar o Reino de Deus e para sermos fiel ao mandato e a missão de evangelizadores que todos, batizados, indistintamente, são convidados a se empenharem.

Irmãos e Irmãs,

No Evangelho deste domingo (cf. Jo 21,1-19 ou 1-14) apresenta a aparição do ressuscitado e a vocação de Pedro a guiar o rebanho que lhe confiado pelo Senhor. A Mãe Igreja aparece como barco de Pedro e como pesca milagrosa (cf. Jo 21,1-14), mas somente pela palavra do Senhor Ressuscitado! Em Jo 21,15-19, utilizando a imagem do rebanho São Pedro é instituído Pastor do Rebanho que é o de Cristo. Pedro, e não o discípulo amigo por excelência. Por três vezes – quantas vezes o negou – Pedro tem que confirmar sua afeição ao Senhor, porque a vocação é sempre graça de Deus, de quem chama para o serviço generoso do seguimento de Cristo.

Jesus acentua na sua conversa com Pedro a dimensão do Seu Seguimento. O discípulo não irá à frente do Mestre. Não é próprio do discípulo inventar novidades. Ao discípulo verdadeiro cabe ir atrás do Mestre, pondo os pés nas marcas de seus pés. De tal maneira que, quem vir as pegadas, veja só as de Cristo, que são também nossas, ou as nossas que se identificam com as de Cristo.

Não quero realizar os meus desejos. Tenho que realizar a vontade que Cristo tem para a minha vida. E todos os desejos de Cristo, expressos em seus ensinamentos e em sua vida, trazem sempre um gosto pascal de morte/ressurreição. Assim o desapego. Assim o amor gratuito. Assim o acolhimento, o serviço, a compreensão, o perdão, a misericórdia, a acolhida, a vida de comunidade, o cotidiano de nossa vida que sempre deve ser Páscoa e santidade de vida e de estado.

A praia, cenário onde Jesus dá de comer pão e peixe, nos relembra a instituição da Eucaristia, a abundância das graças que os discípulos passam a ser dispensadores. Assim, as celebrações eucarísticas são força de unidade e refazimento do mistério da Encarnação e da Redenção de Jesus. Até hoje, como agora, a comunidade reúne-se e cresce em torno da refeição eucarística. É nela que “anunciamos sua morte e proclamamos a sua ressurreição!” É na Eucaristia que conseguimos o destino eterno.

A mensagem fundamental que brota do Evangelho de hoje nos convida a constatar a centralidade de Cristo, vivo e ressuscitado, na missão que nos foi confiada. Podemos esforçar-nos imenso e dedicar todas as horas do dia ao esforço de mudar o mundo; mas se Cristo não estiver presente, se não escutarmos a sua voz, se não ouvirmos as suas propostas, se não estivermos atentos à Palavra que Ele continuamente nos dirige, os nossos esforços não farão qualquer sentido e não terão qualquer êxito duradouro. É preciso ter a consciência nítida de que o êxito da missão cristã não depende do esforço humano, mas da presença viva do Senhor Jesus.

Caros fiéis,

A Segunda Leitura (cf. Ap. 5,11-14) nos ensina que devemos honrar e dar a glória, o louvor e o poder ao Cordeiro de Deus. Como por uma porta, o visionário entrevê os mistérios de Deus: o Cordeiro imolado recebe os atributos do poder decisivo e escatológico. As criaturas que o adoram estão na luz de sua glória: esta é a sua salvação. O Apocalipse apresenta de uma maneira original e sintética, a plenitude do mistério de imolação, de libertação e de vitória régia, que corresponde a Cristo morto, ressuscitado e glorificado. O “cordeiro” (Cristo) é entronizado: ele assumiu a realeza e sentou-se no próprio trono de Deus. Aí, recebe todo o poder e glória divina. A entronização régia de Cristo, ponto culminante da aventura divino-humana de Jesus, desencadeia uma verdadeira torrente de louvores: dos viventes, dos anciãos (vers. 5-8) e dos anjos (vers. 11-12). E todas as criaturas (vers. 13), a partir dos lugares mais esconsos da terra, juntam a sua voz ao louvor. O Templo onde ressoam estas incessantes aclamações alargou as suas fronteiras e tem, agora, as dimensões do mundo. É uma liturgia cósmica, na qual a criação inteira celebra o Cristo imolado, ressuscitado, vencedor e faz dele o centro do “cosmos”.

A mensagem final do Livro do Apocalipse pode resumir-se na frase: “não tenhais medo, pois a vossa libertação está a chegar”. É uma mensagem “eterna”, que revigora a nossa fé, que renova a nossa esperança e que fortalece a nossa capacidade de enfrentar a injustiça, o egoísmo, o sofrimento e o pecado. Diante deste “cordeiro” vencedor, que nos trouxe a libertação, os cristãos veem renovada a sua confiança nesse Deus salvador e libertador em quem acreditam.

Caros irmãos,

Uma primeira consideração a ser tecida relaciona-se com a questão do reconhecimento do Ressuscitado como o mesmo que fora crucificado. A melhor forma de atestar que o Ressuscitado não era um mito, uma invenção ou qualquer outro subterfúgio dos discípulos era reconhecê-lo como o Mestre com quem conviveram.

Aquele que aparecia diante deles não era uma ilusão ou um fantasma, por isso come com os discípulos, como fizera muitas vezes antes de sua morte. Esse texto, contudo, não fala apenas do Cristo: diz algo também sobre os cristãos. Estes serão reconhecidos pela partilha do pão, ou seja, pela comensalidade repetida em cada liturgia eucarística. Assim, o texto não testemunha apenas o Ressuscitado, mas, por antecipação, também os cristãos.

Uma segunda consideração nos leva a entender que essa experiência de encontro com o Ressuscitado permite aos discípulos a ousadia e a coragem de anunciar o Cristo e de testemunhar seus ensinamentos, ainda que sob o risco de serem presos e torturados. Com isso, adverte os cristãos de todos os tempos de que seguir a Cristo e anunciá-lo comporta o risco de sofrer o incômodo das estruturas injustas há muito estabelecidas. A incompreensão e a perseguição podem fazer e fazem, de tempos em tempos, parte da “herança” dos seguidores do Cristo. Enfim, somos chamados, como Igreja, a unir nossa voz à dos anjos e santos num canto de louvor ao nosso Senhor e Salvador.

Meus queridos Irmãos,

Jesus Cristo é o Senhor. Esse é o resumo de nossa fé no Filho de Deus, que morreu e ressuscitou para reinar, para ser a cabeça de todos os poderes, para mandar ou permitir o que quiser. Os cristãos fazem esta profissão de fé: “Creio num só Senhor, Jesus Cristo!”.

Na história da Igreja, Pedro aparece como líder e porta-voz. É ele que, diante do Sinédrio, em nome dos outros apóstolos, dirige ao sumo sacerdote a atrevida palavra, que parece ter sido um slogan dos primeiros cristãos: “É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens” (Cf At 5,29), e pronúncia mais um testemunho da ressurreição de Cristo, que os chefes judeus mataram, conforme nos ensinou a primeira leitura.

Como o Cordeiro, por solidariedade e amor, deu a sua vida em prol do rebanho, assim também o Pastor que recebe seu encargo por seu amor não deixará de dar a sua vida em prol de seu rebanho.

Peçamos, pois, com fé, que possamos viver como cristãos a palavra do Redentor e Salvador. Esta palavra é instancia suprema de nossas vidas. O Senhor ressurgiu e continua a ressuscitar ainda hoje. Ele ressuscita de modo especial na Missa. A verdade central da ressurreição de Cristo aí é comemorada e se torna realidade. Vivamos, pois, com fé, esta realidade e peçamos ao Senhor que nos mantenha sempre firmes em seu seguimento. Aleluia!

 

Padre Wagner Augusto Portugal.

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